quinta-feira, 26 de julho de 2007

Violência contra profissionais de saúde






Déborah Pimentel - Médica e Psicanalista



A perversão expressa em pequenos atos ou gestos, caracterizados como falta de respeito, xingamentos, manipulações ou mentiras são tão corriqueiras que não surpreendem e, até mesmo, chegam a parecer coisas normais do cotidiano. A isso chamamos de violência moral, que só nos incomoda se formos o alvo atingido.
Do contrário, apenas revela certa apatia e indiferença social com o que acontece com as pessoas que estão ao nosso lado, que sofrem caladas e adoecem sob nossos olhos, enfrentando situações que, quando descritas, enquanto fatos isolados, parecem banais e sem importância, mas que, por serem repetitivas, possuem alto poder destrutivo.
A humilhação corriqueira e banalizada desorganiza a vida emocional destes profissionais, comprometendo suas relações afetivas e sociais, o que gera danos importantes para a saúde física e mental que pode evoluir para a incapacidade laborativa, desemprego ou mesmo a morte. Sendo assim, é considerado um risco invisível, porém concreto, nas relações e condições de trabalho. Com a alta competitividade exigida no mercado de trabalho, muitos profissionais de saúde sentem-se acuados quando pressionados de forma abusiva por chefes, colegas e até por usuários.
Os médicos, em especial, formam uma categoria que tem sido vítima freqüente de pacientes e acompanhantes, que acabam os acusando pelas falhas do sistema público de saúde e estes, por temer o desemprego, submetem-se a situações que põem em risco a sua saúde física e mental. Parece, portanto, que a falha do sistema básico, ocasionando grande demanda, é apontada como um fator que estimula a violência.
Em recente pesquisa que realizei pela Universidade Federal de Sergipe, foi detectado que 26% dos profissionais de saúde do Programa de Saúde da Família já sofreram assédio moral. Em 8% dos casos, o agressor foi o chefe imediato; 4% deles sofreram violência dos próprios colegas; 8% sentiram-se atingidos pelo gestor e 9% pelos usuários.
Não pesquisamos, naquela ocasião, a incidência da agressão física, entretanto é possível que estes profissionais tenham muito mais a revelar diante das tristes vicissitudes impostas pela escolha profissional e as cruéis condições vividas em ambientes de trabalho mal estruturados que justificam a presença de tanto sofrimento físico e mental destes profissionais.
Temos tido notícias de freqüentes de cenas de violência e agressões que vão das verbais às físicas nas agências da Previdência Social, onde trabalham cerca de quatro mil médicos peritos que atendem aos segurados do Instituto Nacional do Seguro Social em todo o país, inclusive em Aracaju.
Segundo a Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência, somente em 2007, foram registradas, na Polícia Federal, 45 agressões físicas contra médicos peritos em todo o país. Sabe-se, inclusive, de vários colegas que foram assassinados revelando que os médicos peritos vivem um cotidiano de total insegurança, expostos à violência de quem os procura com o objetivo de receber algum benefício.
Pesquisa realizada, em 2006, pelo Sindicato dos Médicos de São Paulo, revelou que 41% dos médicos que trabalham em São Paulo já sofreram algum tipo de violência no ambiente de trabalho. Os hospitais públicos lideram o escore das agressões (77,1%).
A maior incidência acontece nas unidades de prontos-socorros (61,19%). Os gestores que, na maioria das vezes, desconhecem as pesquisas, até por ser mais confortável para eles não enxergar tamanhas mazelas, deveriam, nestes casos, ser responsabilizados civil e criminalmente, por não prover segurança nos locais de trabalho.
Ainda há esperança: o noticiário anuncia que a violência contra profissionais de saúde e professores, outra categoria sofredora, vai ser crime de investigação prioritária na próxima versão da proposta de lei da política criminal para o biênio 2007/2009.
Enquanto isso, só nos cabe rezar e lembrar a estes profissionais que, de acordo com o artigo 331 do Código Penal: desacatar funcionário público no exercício da função gera punição, e que se as autoridades não se manifestam ou ficarem omissas, o trabalho médico poderá ser suspenso naquela unidade de saúde.

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